O entrevistado dessa vez é um grande amigo que todos conhecem como Tonhão ( amarques2002@yahoo.com.br ), um cara que não tenho o menor pudor em afirmar de que certamente é um dos mais espetaculares e capacitados profissionais para reparar ou restaurar qualquer que seja o seu equipamento de som.
Uma pessoa que me faz voltar 30 anos toda vez que vejo sua linda coleção de vintages, impecáveis na aparência e nas funcionalidades, é como estar diante de uma vitrine imaginária de minha juventude… Nesse link aqui tem um pouco de seu impecável trabalho e vale com certeza uma visita com muita atenção para conhecer o “antes” e o “depois” de cada aparelho: https://picasaweb.google.com/106296877550130037709
O mais legal dessa entrevista é que ela foi formulada pelo grupo de discussão SOM TRÊS (http://br.groups.yahoo.com/group/somtres/) criado para tratar sobre Vintages e que tenho como uma verdadeira família e por isso, aproveito o momento para agradecer a todos os paticipantes da lista pela realização dessa entrevista e deixar o convite para quem não conhece a lista, que entre, puxe o banquinho e particpe pois trata-se de um espaço único para quem gosta de falar sobre audio em todas as suas variáveis.
Quando e como começou esse amor por manutenção e restauração de equipamentos de áudio?
Desde pequeno eu sempre gostei de coisas ligadas à eletrônica e os únicos equipamentos que existiam na época eram os televisores, rádios e vitrolas. Quando chegou o momento de cursar o 2 grau em 1976, a opção natural foi escolher o curso para formação em técnico em eletrônica.
Meu pai já havia descoberto em 1975 um curso de Rádio e TV chamado Electra que era muito popular e me perguntou se eu queria fazê-lo. Chamei dois amigos e fomos os 3 fazer o curso. Após um ano e meio ganhamos o diploma de técnico em rádio e TV e as manutenções começaram. Primeiramente eram equipamentos de parentes e depois de amigos e clientes. Com o passar dos anos fui evoluindo, assim como nossa indústria de áudio. Com o mercado repleto de marcas e seus modelos variados, foi apenas uma questão de tempo para mexer em muitos deles.
Você já usou, tem algum, conhece ou gosta de DAT ?
Rsrsrsrsrsrs. O nome dado à minha sala de audição (DATCaverna) veio exatamente da fascinação que tenho por este tipo de equipamento e da quantidade elevada de modelos que possuo. Acho que tenho umas vinte unidades diferentes dos mais renomados fabricantes; Sony, Tascam, Denon, JVC, Otari, etc…..
Tudo começou quando um dia vi uma unidade da Sony sendo vendida com defeito por apenas R$ 90,00 em um brechó. Arrematei a criatura, mas imaginando que seria um verdadeiro milagre fazê-lo voltar a funcionar. Ocorre que milagres acontecem e depois de muitas horas de bancada, a criatura “renasceu das cinzas”!!!!! Daí em diante outras unidades foram sendo adquiridas sempre com defeito e somadas à coleção após serem devidamente restauradas. Os DAT’s são máquinas maravilhosas tanto em sua eletrônica quando na mecânica utilizada. O resultado desta união é um deck capaz de gravar e reproduzir sinais de áudio no formato digital sem qualquer tipo de compressão e com a menor perda possível de informações. Quem ainda não teve a oportunidade de ouvir um DAT, não tem idéia do que está perdendo.
Fale de sua DATCaverna. Como surgiu, quais as atividades de que você gosta de fazer lá?
A DAT Cave ou DAT Caverna surgiu como a concretização de um sonho de muitos anos, em criar um espaço específico onde pudesse me isolar e curtir meus equipamentos de áudio e vídeo. Este nome foi dado carinhosamente por um grupo de amigos muito especiais (Carlos Herz, Godar, Sérgio Gallo e Monteiro), que sabiam de minha paixão pelos DAT’s e também da quantidade destes equipamentos que possuo.
Quando me casei possuía um sistema de som humilde composto de alguns módulos que consegui comprar durante minha adolescência:
- Amplificador Spectro SQA-2100
- Tuner Polyvox TP-401
- Equalizador Cygnus GEQ-1012
- Caixas Bravox BBR-12C
- Toca discos Philips GA-312
- Tape deck Polyvox CP-750D
Utilizava um dos quartos da casa como “quarto de som” até que minhas filhas nasceram e aí no lugar dos equipamentos de som foram colocados berços rsrsrsrs. Daí para frente voltar a ter um ambiente específico para ouvir música e assistir filmes ou shows, passou a ser um sonho que só veio a se concretizar muitos anos mais tarde quando finalmente comprei meu apartamento e construí a DAT Cave.
O que era um espaço apenas para audições e Home Theater, acabou se tornando em uma mistura louca de laboratório de testes, “depósito” de equipamentos de clientes aguardando reparo ou já reparados e vitrine de minha pequena coleção de equipamentos de áudio.
Hoje é na DATCave onde recebo os vários amigos que fiz no decorrer dos anos, é onde os testes finais dos equipamentos reparados / restaurados são realizados e onde consigo me isolar de tudo e de todos, minha verdadeira “caverna”!!!!!!
O que você acha dos valvulados?
Quando fiz meu primeiro curso de eletrônica em 1975, fui formalmente apresentado às válvulas que ainda imperavam praticamente absolutas nos televisores e rádios. Minha primeira missão foi consertar um rádio a válvulas de um tia e fiquei muito feliz ao vê-lo voltar a funcionar. Infelizmente nesta época não tive acesso à equipamentos de áudio Hi-Fi e logo na sequencia os transistores assumiram uma posição de destaque, derrubando literalmente as válvulas por terra abaixo.
A quase dez anos atrás tive a oportunidade de conhecer o Eduardo Lima da Audiopax e pude presenciar o que veio a ser o meu reingresso no mundo das válvulas. Na época tive o prazer de ouvir um conjunto composto de pré + power valvulado e caixas que ele produzia e saí de lá encantado com o que ouvi.
Depois deste dia decidi montar meu próprio sistema valvulado e hoje considero o som dos valvulados algo diferenciado e único em relação aos equipamentos transistorizados. Atualmente sou fã de prés amplificadores valvulados e além dos vários que tive a oportunidade de ouvir, também venho desenvolvendo projetos próprios que pretendo comercializar em breve. Em suma, EMHO quem ainda não teve a oportunidade de ouvir um bom equipamento valvulado, não tem idéia do que realmente significa o termo HI-FI.
Como se sentiu quando contou no DIY Fest a história de seu conjunto valvulado totalmente DIY e foi aplaudido demoradamente?
Aquela experiência foi única e jamais poderei esquecer. Quem me conhece sabe que sou um cara bem devagar e falar em público não é bem a minha praia. Antes da apresentação estava muito preocupado com o que seria o resultado sonoro da interligação do meu power valvulado às caixas Sublimes do Sérgio, que na verdade foram as primeiras caixas desta linha produzidas pelo Renato. Até então o valvulado só havia tocado na DATCave e ligado às Quasar QC-2004 em um ambiente com menos de 30 metros quadrados, enquanto o auditório onde o DIYFest estava sendo realizado media mais de 100 metros quadrados e repleto de visitantes!!!!!
Talvez a pessoa mais surpresa ao final da apresentação tenha sido eu próprio, pois realmente o som agradável emitido pelo conjunto foi capaz de encher o ambiente de uma forma que sinceramente eu não esperava. Ficou ali provado que a sinergia entre equipamentos puramente DIY é uma arma poderosa e capaz de agradar a muitos, quebrando qualquer tipo de preconceito existente.
Quantas amizades e conhecimentos suas atividades lhe proporcionaram?
Sempre realizei reparos em equipamentos como uma forma mais de lazer do que por necessidade financeira. Ter o prazer de ver um equipamento voltar à vida e apreciar a forma como foi projetado, sempre me fascinou. Com o advento da Internet e as redes comunitárias, acabei ingressando em algumas Listas de
Discussão e foi em uma destas que conheci nosso amigo Carlos Herz. Na época ele me convidou para ir até sua residência, pois possuía alguns equipamentos de áudio e precisava de ajuda para reparar um deles. Ao chegar em seu apartamento me deparei com várias prateleiras repletas de peças raras de um tempo de outrora, eram receiver’s Marantz e Pioneer, tape deck’s Pioneer, Equalizadores Sansui, etc…. todos muito bem organizados e tratados, um verdadeiro tesouro Vintage.
Acabei levando um de seus receiver’s Marantz que apresentava defeito e mais tarde o devolvi devidamente reparado. Ele ficou tão feliz que postou uma nota com fotos no HTFórum e dali para frente tudo mudou em minha vida, inclusive a criação do apelido que passou a ser o meu codinome, Tonhão.
Hoje são dezenas ou mesmo centenas de amigos espalhados por este Brasil a fora……
Pode nos contar algo sobre seus Projetos futuros?
Como minha vida mudou radicalmente em função de ter perdido meu emprego depois de mais de 20 anos na mesma empresa, me vejo em meio a um turbilhão de idéias e dificuldades a serem vencidas.
Mais do que nunca agora dependo dos reparos e restaurações que já fazia e ao mesmo tempo vejo como oportunidade a criação de uma pequena indústria voltada para o mundo do áudio. A intenção é desenvolver produtos de qualidade a preços justos, propiciando a oportunidade de pessoas poderem adquirir determinados equipamentos sem que para isso tenham que desembolsar valores absurdos.
O primeiro projeto já em curso em parceria com um amigo, será um pré amplificador valvulado com alguns recursos diferenciados, como por exemplo fontes de alimentação totalmente estabilizadas por reguladores, controle de funções por microcontrolador “PIC”, painel com LCD, seleção de fontes por micro relés, conectores RCA de qualidade, transformadores da fonte em módulo separado, sistema de montagem totalmente modular, etc…..
Sabemos que passam por suas mãos alguns verdadeiros ícones do áudio dito hi-end. Sobre o ponto de vista da engenharia o que você vê dentro desses equipamentos são de fato o supra sumo da tecnologia de suas respectivas épocas?
A princípio sim, tenho tido a oportunidade e a grata satisfação de lidar com verdadeiras obras de arte, sejam do passado ou do presente, mas nem sempre isso é verdade absoluta.
Como verdadeiro brasileiro não posso deixar de homenagear o que considero um dos ícones de nossa indústria do áudio, o fabricante Spectro.
Por incrível que pareça um dos equipamentos nacionais mais sofisticados que peguei foi o amplificador Specrto SQA-2100 de 1974. Nesta época nossa indústria estava desabrochando e a Spectro que era um fabricante até então desconhecido lançou este “pequeno” grande amplificador. Pequeno apenas em suas dimensões, foi um dos equipamentos que mais somaram itens sofisticados tanto em seu interior como exterior, em forma de soluções criativas. O termo hi-end ainda não existia nesta época, mas sem dúvida ele poderia ter sido considerado como tal.
Foi um dos primeiros senão o primeiro amplificador nacional a implementar uma fonte estabilizada para alimentação do estágio de potência, seu estágio de potência possuía nada menos do que 13 transistores por canal, enquanto a maioria esmagadora dos concorrentes apenas 6. Sua montagem era totalmente modular e para interligar as várias placas, soquetes de válvulas foram cortados e adaptados como conectores macho/fêmea de interligação. Nos controles de tonalidade ao invés de potenciômetros convencionais, foram utilizadas chaves de onda como divisores resistivos. Seu painel retro iluminado com todas as inscrições em português também foi inovador. Todos os Knobs foram torneados em barras de alumínio sólidas, pela própria Spectro, verdadeiras jóias lapidadas uma a uma por torneiros habilidosos.
O fabricante confiava tanto em seu produto que dava 5 anos de garantia integral.
Outro exemplo de Hi-End Vintage seriam os equipamentos da Revox, renomado fabricante alemão. Em qualquer que seja o modelo produzido por este fabricante, você verá o que de mais moderno existia aliado a uma montagem impecável, além de uma robustez incomparável. Produtos de extrema qualidade e som diferenciado.
Posso também citar nomes como McIntosh, Mark Levinson, Gryphon, Cary, Krell, Marantz, Threshold, etc… onde não foram poupados custos em seus desenvolvimentos / montagens e usados componentes verdadeiramente top’s.
Por fim e infelizmente, mesmo as grandes marcas acabam cobrando valores absurdos por determinados modelos, que nem sempre possuem em seu interior componentes ou circuitos à altura. Produtos que pegam carona na onda do modismo e dos conceitos puramente comerciais, criados para iludir e lesar os clientes menos preparados tecnicamente.
Qual foi o problema mais “cabeludo” que você já pegou e como resolveu?
Esta é uma resposta difícil, pois foram muitos os desafios no decorrer dos anos, mas poderia citar o caso polêmico de um amplificador Krell que acabou sendo muito discutido em um consagrado Fórum e Lista de Discussão. Devido ao fato deste fabricante não liberar qualquer tipo de documentação técnica e somado ao fato da unidade em questão ter sido muito fuçada/mexida por outro “técnico”, seu reparo foi muito difícil, implicando na elaboração de esquemas elétricos levantados a partir de inspeção visual das placas e importação de peças específicas. Ao fim, graças a este levantamento técnico foi possível identificar erros grotescos, que haviam sido cometidos na tentativa de reparo anterior, inclusive utilizando-se peças totalmente incompatíveis com a funcionalidade dos circuitos. Devidamente corrigido tais erros com o uso de peças corretas e originais, o equipamento voltou a funcionar em sua plenitude.
De onde surgiu a idéia de lavar com água e sabão os componentes eletrônicos dos aparelhos que você recebe para arrumar?
Este procedimento que realizo começou em 1982 quando trabalhava em uma empresa que produzia equipamentos para comunicação de dados (modems, multiplexadores, unidades de derivação, etc….). Eu trabalhava no laboratório de manutenção onde chegavam centenas de equipamentos todo mês para serem reparados e muitos deles em péssimas condições, com “toneladas” de sujeira na forma de gordura e pó. Foi então que um belo dia resolvi lavar o gabinete de um deles e aproveitando o embalo acabei lavando também suas placas de circuito impresso. O resultado foi tão bom que passamos a adotar este procedimento como padrão em muitos dos equipamentos que chegavam. Acabei levando esta técnica para o mundo dos equipamentos de áudio e o resultado vocês já bem conhecem.
Já aconteceu de perder algum aparelho com essa técnica?
Nunca!!!!!!!!! É um procedimento que realizado de forma consciente e tomando o mínimo de cuidado, não tem como danificar nenhum equipamento. Obviamente determinados componentes não podem/devem ser molhados, como por exemplo os transformadores, sejam eles de alimentação ou de saída de áudio como no caso de equipamentos valvulados, assim como qualquer tipo de VU eletromecânico que também deve ser preservado.